João Gilberto Saraiva

desenvolvedor de software | professor | escritor


Cinco atitudes para o aprendiz | João Gilberto Saraiva

Cinco atitudes para o aprendiz

13-08-2023

Não é incomum que certo dia, admirando distraidamente o nada com uma xícara de café na mão, nos encontremos refletindo sobre uma ideia, atitude ou informação que teria feito toda a diferença se soubéssemos daquilo antes. Como seria bom entender disso naquela época… Se eu fosse assim há dez anos… Os infinitos “se” que nos assombram de vez em quando ou sempre. Examinar isso através do microscópio da razão evidencia que o que somos e sabemos hoje é resultado justamente dos percalços que passamos, não havia como ter esses saberes e perspetivas sem as vivências que os proporcionaram. É até reconfortante pensar assim, mas não há colete a prova de balas para a vontade repentina de voltar no tempo com aquela atitude ou resposta na ponta da língua. O passado é coisa viva, não dá para simplesmente arquivá-lo numa pasta esquecida do disco de memória. Nenhuma inteligência artificial ou orgânica existe sem processar continuamente seu próprio repositório de informações.

Eu me peguei pensando nisso quando, numa mesma semana, dois jovens me perguntaram sobre habilidades e saberes necessários para começar uma jornada de conhecimento e trabalho. O primeiro, ex-aluno meu do Ensino Fundamental, vai iniciar o curso de História, o segundo é um estudante de programação querendo dar o primeiros passos no mercado de trabalho. Eu me perguntei o que poderia dizer de útil ao adolescente João Gilberto aprendendo a tocar instrumentos musicais e ao mesmo indivíduo quando ele estava prestes a entrar na universidade e primeiro emprego. Também ao professor pós-graduado fazendo suas primeiras linhas de código. Juntei isso a experiência de ter aprendido e ensinado sobre os mais variados temas e sintetizei alguns pontos:

  1. Ter curiosidade genuína: aprender é um verdadeiro martírio se não nos interessamos pelo tema ou não vemos sequer sentido em estar estudando aquilo. É claro que nem todo assunto é a grande paixão que nos entusiasma profundamente, mas os tijolos do desinteresse e o cimento da preguiça formam, na maior parte das vezes, um muro intransponível.

  2. Ser mentorável: estar aberto a aprender com diversas pessoas e em diversos contextos. Muito além da situação formal de sala de aula, a existência é rica em situações em que podemos aprender algo. Estar aberto a isso, ouvidos e ego preparados, é um pequeno preço para o ganho que se pode obter assim.

  3. Saber perguntar: as perguntas movem a humanidade. É uma frase gasta e verdadeira, como mostra o sucesso dos buscadores da internet - o maior deles processa cerca de 3.5 bilhões de perguntas diariamente. Saber perguntar é contextualizar a questão, delimitar o escopo do que se quer saber e considerar efetivamente as respostas obtidas antes de lançar uma nova pergunta. Algo que serve para questionar um colega de turma, um fórum ou mesmo uma inteligência artificial gerativa.

  4. Aprender a aprender: não há uma fórmula pronta através da qual todas as pessoas aprendem efetivamente um determinado assunto. O que existem são estratégias diversas para o aprendizado, mais ou menos efetivas para determinado contexto. Em outro post explorei justamente esse aspecto, desde a escolha do material mais adequado a entender o melhor modo como aprendemos. Vale pensar nas experiências anteriores, quando foi que você conseguiu aprender com sucesso e quando deu errado? E o mais importante, por quê?

  5. Praticar: esses dias conversando sobre a importância da prática para se aprender, eu lembrei uma frase que acredito ser de origem holandesa: “nunca existiu, nem nunca existirá um bom livro sobre como aprender a andar de bicicleta”. A perspectiva não é desmerecer os livros - quem me conhece sabe do meu amor por eles -, e sim sublinhar a importância de se praticar constantemente. A teoria é letra morta se não fundamenta a ação, e bons músicos me fizeram perceber que para se aprender, o melhor modo é começar calmamente com exercícios simples e ir aumentando a velocidade e complexidade gradualmente. Há um ciclo virtuoso entre se deparar com um conhecimento (seja lendo, assistindo, ouvindo, etc.), tentar fazer (exercício, projeto pessoal, conversa e afins) e repetir esse processo mudando as estratégias de cada passo. Já escrevi um pouco mais sobre esse elo entre aprendizado e prática no texto Oleiros do deconhecido.

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Imagem: “High five” de Martin Fisch. Fonte: Open Verse, Creative Commons 2.0